Fabio Akita Report

Às vezes filosofando, às vezes sendo pragmático. Por vezes duro e severo, outras mais diplomático. Eventualmente vendendo, eventualmente realizando. Assim é a vida de um consultor em sistemas de informática de grandes empresas. De esquina em esquina, ouvimos histórias interessantes. Não sei se são interessantes, mas vou reportá-las, mesmo assim.

sexta-feira, dezembro 16, 2005

Zealots: to be or not to be

Não é de hoje que os "zealots" existem. Segundo a Wikipedia (http://en.wikipedia.org/wiki/Zealot), um zealot é uma pessoa que denota zelo em excesso, por uma causa, uma ideologia, ao ponto de se tornar prejudicial aos outros e inclusive à própria causa. São os fanáticos.

Falando especialmente da área de informática, nos nossos dias de Internet, é muito fácil encontrar um zealot. Seja pró-Linux, pró-Java, pró-Mac ou mesmo os anti-Microsoft. Eles são muito úteis à medida que tornam tecnologias reconhecidas, ensinam os outros, divulgam a palavra, ou seja, se tornam evangelistas. O problema é quando o evangelismo salta ao próximo nível: ao de "zealotismo".

Vejamos um exemplo: com o Java foi assim. Quando a Sun o lançou há 10 anos, a plataforma era não mais do que um sandbox para pequenas animações no navegador Netscape. Graças à nova mídia pela internet, mesmo sem grandes campanhas, sem muito marketing, apenas no boca-a-boca, ele se tornou a potência que conhecemos hoje. O que os zealots, e os fãs em geral, não entendem é que tudo segue o mesmo ciclo de vida: nascem, crescem e, eventualmente, morrem. Esse ciclo de vida é particularmente menor se a plataforma não evolui para o lado correto.

Depois de uma década, o Java se extendeu dezenas de vezes, com dezenas de acrônimos que muitos nem se lembram mais: Java2D, J2EE, J2ME, J2SE, JMS, Jini, JavaCard, MIDP, PersonalJava, JCA. Mais ainda, dezenas de extensões vindas do mundo open source como Struts, Tiles, WebWorks, Echo2, Hibernate tornam a plataforma Java como um todo desnecessariamente complexo.

Agora, os zealots vão discordar "quanto mais opções melhor". Mas os fanáticos esquecem que o resto do mundo não compartilha do mesmo entusiasmo e a maioria quer tão somente o necessário para realizar seu trabalho, assim como usar um Visual Basic, que pode ser considerada uma plataforma auto-suficiente (uma única IDE, um único conjunto consistente de funções). "Esses programadores são todos amadores", novamente discordarão os zealots. Porém eles entregam seus projetos no prazo e no custo, sem perder tempo ruminando sobre a "arte" embutida na escolha desse ou daquele framework.

Eu particularmente gostaria de ver a Sun assumindo de uma vez sua criação e criando um pacote único, conciso e robusto, da mesma forma como a Microsoft conseguiu fazer com seu Visual Studio.NET. Porém, isso seria muito ruim pois afastaria os zealots e a comunidade que eles representam, e eles perderiam seus macacos de auditório, que tanto alardeiam o mercado sobrea as maravilhas do software livre. Uma paradoxo e tanto, e imagino que isso deixe irritado os executivos da Sun. Não por acaso é que dizem: "diga-me com quem andas e direis quem és".

Voltando à conversa do ciclo de vida, nós vimos o Java nascer como uma nova plataforma, aberta, flexível e robusta, evoluir como uma amálgama de soluções desconexas e, finalmente, estamos começando a vislumbrar o próximo passo. Bruce Tate, famoso entre os javeiros, já lançou um livro chamado "Beyond Java", que tem se tornado controverso e polêmico já que o autor, famoso evangelista, está sendo herético segundo os zealots: ele está rascunhando a possibilidade da morte do Java.

Bruce Tate é sábio e, novamente, os zealots ignoram a História. Ignoram que História sempre se repete. Ignoram as velhas histórias do Cobol, Basic, dBase, Clipper, Dataflex, Powerbuilder, Delphi. Em seu tempo, cada qual foi um Java, mas atualmente poucos ainda ouvem falar neles. Eu vivi a era de cada uma dessas plataformas e outras tantas. Por isso mesmo, vi o Java em seu berço, antes de seu batismo quando ainda era chamado Oak. Não me surpreenderia se amanhã ele não existisse mais.

Este é o momento em que vejo um zealot tendo um chilique no fundo da platéia: "o Java morrer? Absurdo!".

Nem tanto. Talvez pelo fato de ter vivido tantas micro-eras diferentes me acostumei a aprender coisas novas continuamente. Foi como aprendi a linguagem ABAP/4,  Java, C#.NET, PHP, e tantas outras linguagens, padrões e plataformas e agora mesmo estou aprendendo Ruby. Não é um fato novo.

Porém, muitos dos zealots são garotos. Jovens, inexperientes, entusiastas e desacostumados a frustrações.

Quando começaram a entrar no meu mundo, o Java já existia, já fazia sucesso. Eles não conseguem imaginar um mundo sem Java. Já tive uma época assim também, mas no meu tempo era o Basic.

O que esses garotos precisam aprender é justamente como ser um bom autodidata, auto-suficiente, com aprendizado contínuo e ininterrupto. É extremamente cômodo aprender alguma coisa, se tornar experiente e se encostar nela, tentando ao máximo impedir que ela suma. E mesmo quando ela de fato some, tentar acreditar que isso não aconteceu, fechar os olhos. Porém, a História se repete, tudo acaba um dia ou pelo menos se modifica significativamente. Não estou afirmando que o Java morrerá em breve, mas estou sinalizando que essa possibilidade é real.

Os zealots gritam pelo novo mas continuam com a atitude dos velhos.

Ninguém precisa ficar fazendo cursos e mais cursos para aprender coisas novas, ou pior, só tentar aprender quando a situação chega a tal ponto que só resta isso ou morrer. Aprender deveria ser natural, orgânico, como respirar e comer. É o que faço. Quando aprendi Basic nos idos dos anos 80, ou agora quando estou aprendendo Ruby. Nunca precisei de professores, sala de aula, provas. Tudo que sei de Java hoje, aprendi sozinho. E não só em informática. O que entendo de SAP, por exemplo, também aprendi sozinho. Logicamente, quando digo "não precisei de professores", quero dizer que não preciso do modelo de sala de aula, mas é um fato que sempre dependi muito de grandes amigos, mais experientes, que sempre me ajudaram a aprender coisas que eu não conhecia. Devemos sempre aproveitar a chance de estar em contato com grandes mestres.

Como diria Sócrates, "tudo que sei é que nada sei". E isso é outro fator importante: quando se é ignorante, acha-se que sabe de tudo. Quando nos propomos a aprender, quanto mais novidades entendemos mais compreendemos que falta muito ainda a saber. Comecei falando sobre informática, mas no fundo esse conceito "ser auto-suficiente" vale para qualquer área. Vamos deixar o zealotismo de lado, voltarmos a ser racionais e modificar nossas atitudes para a única coisa que realmente interessa: nossa auto-evolução. Se eu pudesse deixar uma mensagem como legado, é com isso que gostaria de ser lembrado.

Think about it.

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