Fabio Akita Report

Às vezes filosofando, às vezes sendo pragmático. Por vezes duro e severo, outras mais diplomático. Eventualmente vendendo, eventualmente realizando. Assim é a vida de um consultor em sistemas de informática de grandes empresas. De esquina em esquina, ouvimos histórias interessantes. Não sei se são interessantes, mas vou reportá-las, mesmo assim.

domingo, fevereiro 05, 2006

Consultores: PJ VS CLT (De novo!)

Não considero que seja um consultor faz muito tempo. Na realidade estou indo apenas para meu quinto ano como pessoa jurídica prestadora de serviços.

Porém, nesta curta jornada, me deparei diversas vezes com o velho dilema do PJ (Pessoa Jurídica) comparado ao CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas). Todos querem dar seus “pitacos”. Sou da opinião que não existe uma resposta absoluta, aliás, como todos os grandes dilemas. A única resposta que vejo é: it depends.

Claro, é muito mais fácil dizer "depende" do que argumentar a favor de um lado ou de outro. Veja o lado CLT: trabalho de carteira assinada, com fundo de garantia, previdência, férias pagas de 1 mês, décimo - terceiro salário (e às vezes décimo - quarto, quinto), convênio médico e por aí vai.

Por outro lado veja o PJ: trabalho instável, sem carteira assinada, pode passar períodos sem trabalho, não tem nenhum benefício, convênios, previdência, nem nada. “Óbvio”, pensam os trabalhadores CLT, “é muito melhor trabalhar com carteira assinada”.

Não é bem assim. Digamos que o José seja CLT ganhando $1000. Para ter todos os benefícios e estar em dia com o governo, seu empregador para para o governo praticamente mais $1000. Portanto, o José custa para sua empresa, quase o dobro do que ganha, ou seja, $2000. Fora os cerca de 30% de impostos retidos na fonte. Portanto, o José leva líquido para casa cerca de $666, depois de descontados os impostos. Dos $2000 que seu empregador tem que desembolsar, $1333 vão diretamente para alimentar os gordos e famosos “Caixas 2” dos políticos, para financiar seus objetivos "republicanos".

Por outro lado, um prestador de serviços PJ é, por definição, uma empresa – mesmo que seja de um empregado só. Ele emite nota fiscal e negocia o valor do seu trabalho. Como não se trata de um funcionário próprio, o empregador veste o chapéu de cliente e seu “empregado” na realidade veste o chapéu de fornecedor. É outro cenário, completamente diferente do primeiro. O fornecedor oferece um serviço e tem a responsabilidade de entregar conforme as condições de prazo, custo e escopo negociados. Por sua vez, a única responsabilidade do cliente é pagar as faturas nas datas combinadas. Não há vínculo empregatício, não há nenhum benefício. É um sistema justo de pagamento pelo serviço.

Portanto, não é absurdo um Paulo, cobrar do seu cliente, $1500 pelo mesmo serviço que o José faria por $1000, afinal, o cliente não precisará pagar os absurdos 100% de impostos que a CLT impõe. Além disso, dependendo da razão social da empresa de Paulo, ele pagará em média 12% sobre seu faturamento, dentro das leis de lucro presumido. Portanto, no final do mês, Paulo leva líquido, cerca de $1320.

Ou seja, no segundo cenário, Paulo leva quase o dobro a mais que José e o cliente/empregador economiza praticamente 25% do seu custo. Isso, fazendo as contas bem arredondadas, como diriam, “conta em papel de pão”. Mas fica óbvia a diferença. E num terceiro cenário ainda temos que levar em consideração os famosos “intermediários”, comumente chamados de “Consultorias”. Elas facilitam a entrada do “consultor” dentro do cliente. A essa atividade costumamos chamar de “body-shop”, literalmente a “consultoria” ajuda o seu cliente a montar equipes no mercado de trabalho. Assim, a consultoria emite uma fatura única por um “projeto” ao seu cliente e o consultor emite sua fatura à consultoria. Nesse meio do caminho, a consultoria ganha uma porcentagem pelo seu “overhead”, ou seja, seu “árduo” trabalho de ajudar os consultores a entrar nos clientes.

Concordo: foram muitas aspas dentro de um mesmo parágrafo. Complementando o ar de cinismo, ainda existe aquela velha polêmica velada sobre “vínculo empregatício”, afinal, há os que dizem que sobre um certo conjunto de circunstâncias, na realidade o consultor poderia ser considerado como um empregado e nesse caso o empregador estaria sujeito às leis penais previstas na CLT. Claro, que ninguém leva isso a sério, afinal TODA consultoria de serviços (seja de informática, advocacia, saúde, engenharia, etc) funciona exatamente da mesma maneira. Lembro que no ano passado o governo tentou fechar esse cerco mas como vocês perceberam, nada apareceu nos jornais sobre fechamentos em massa de consultorias. E ninguém viu nem ouviu por um motivo óbvio: porque nada aconteceu.

Agora vou acabar puxando a sardinha para o lado dos PJs (acreditem, irei me retratar). A grande verdade é que a CLT é um entrave importante para o desenvolvimento do país – dentro de outros igualmente graves como a falência da infraestrutura do país, a carga tributária pateticamente elevada e a burocracia mórbida das repartições públicas. A CLT é um conjunto de leis antigas que não se encaixam mais na dinâmica do país.

Uma empresa que já incorre em todas essas dificuldades que mencionei mais diversas outras, ainda ter que pagar $1333 para o governo para um serviço onde seu empregado male-male ganha $666? O que o governo fez para merecer o DOBRO do que o funcionário ganha. Zero, Zip, Nada. Absolutamente nada. É um dinheiro que vai essencialmente para um buraco negro criado por um antro chamado “político”. Afinal, digo e envangelizo: deveria haver no Aurélio, no Michaelis e no Houaiss que a definição única de “político” é rei da procrastinação e consumidor em tempo integral dos recursos públicos para uso essencialmente pessoal, sem absolutamente nenhum interesse em prestar serviço a seus empregadores: a sociedade.

Quais as reais vantagens de se tornar um PJ: se tornar seu próprio chefe, pois de agora em diante é um autônomo. Se um cliente lhe “encher o saco”, você pode, literalmente mandá-lo à merda. Obviamente, sua quantidade de liberdade será diretamente proporcional à sua competência e reputação. Se você for um incompetente, é melhor mesmo continuar sendo um empregado esquecido em algum canto de alguma grande empresa.

Outra coisa é que não temos nenhum benefício empregatício, pelo motivo óbvio de não sermos mais empregados. Porém, podemos negociar um valor bruto muito maior com nosso cliente, já que este não incorre no patético volume de impostos que a CLT manda recolher. Mais ainda, não pagamos mais de 30% de impostos retidos na fonte. Pagamos uns 10% mensalmente de PIS, COFINS, INSS, ISS e parte do IRPJ retido na fonte e trimestralmente IRPJ e CSLL. Se soubermos controlar nosso fluxo de caixa, teremos um lucro líquido muito maior que um CLT.

Obviamente, ser um autônomo só faz sentido para pessoas competentes. Como já disse antes, você negocia seu valor por hora segundo suas credenciais. E não estou me referindo a coisas supérfluas como diploma de pós-graduação ou qualquer outra certificação barata dessas que está na moda. Suas credenciais são diretamente ligadas a seu tempo de experiência e reputação no mercado. Por isso mesmo muitos trabalhadores CLT dizem que a insegurança de ficar desempregado é a maior razão de não abandonarem seus lugares confortáveis como CLT: eles jamais conseguiriam concorrer conosco.

O outro lado da moeda é justamente esse: existem os CLTs que, cansados de ganhar pouco, querem ganhar dinheiro fácil. Resolvem se tornar PJ mas continuam com mentalidade de CLTs. Ou seja, esperam ter os mesmos benefícios, esperam ter férias pagas, esperam receber tudo no dia certo e além de tudo isso ainda esperam ganhar mais.

É óbvio que esses tipos reclamam. Todo bom empresário sabe que clientes nunca pagam nas datas corretas, sabem que contratos não valem nada no Brasil, onde a justiça caminha praticamente para trás, sabem que precisam ter fluxos de caixa bem controlados para não serem pegos de surpresa por algum cliente inadimplente. Ou seja, os pseudo-PJ esquecem que ser “Pessoa Jurídica” é, acima de tudo, ser um empresário. Você se torna uma empresa prestadora de serviços, e espera-se que esse recém-empresário assuma tais responsabilidades.

Portanto, voltando à questão do “it depends”. Se você for razoavelmente empreendedor, souber assumir responsabilidades (e responder por elas!), é realmente competente e está sempre se atualizando, talvez ganhe muito mais sendo um PJ. Porém, se for do tipo que prefere a rotina de receber sempre no dia certo, ter um horário certo, ter atribuições certas, ter férias pagas, décimo – terceiro e mais ainda, é incompetente, não gosta muito de trabalhar e muito menos de se atualizar e seu único objetivo na vida é ser um macaco buscando a promoção do mês sem merecer e ir à praia no carnaval, então esqueça: seu futuro é como CLT mesmo.

Seja um especialista, trabalhe 20 anos na mesma empresa, espere ela quebrar (afinal, você está no Brasil) e depois de desempregado fique surpreso em ver que aquela sua especialidade já não vale mais nada no mercado. Então pegue seu fundo de garantia e abra um pequeno comércio e arrependa-se de nunca ter se instruído e experimentado como micro-empresário. Comece a não fazer contabilidade, a não controlar seus gastos, a tirar dinheiro do caixa da empresa para trocar seu carro. No fim, você estará falido.

Think about it.